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Golpes Militares em África: O que Realmente Determina o Regresso ao Poder Civil?

Baseado na investigação de Sebastian Elischer, Professor Associado de Ciência Política na Universidade da Florida, EUA.

https://theconversation.com/military-coups-in-africa-heres-what-determines-a-return-to-civilian-rule-211353

Contexto: Uma Nova Vaga de Intervenções

Desde 2020, a África, em particular a região francófona ocidental, tem testemunhado uma vaga preocupante de golpes militares: Mali (2020, 2021), Chade (2021), Guiné (2021), Sudão (2021), Burkina Faso (2022), Níger (2023) e, mais recentemente, Gabão (2023). Esta tendência levanta uma questão crítica: após a tomada de poder, o que determina se um país retornará ao regime civil? A investigação do cientista político Sebastian Elischer, que estuda golpes há mais de uma década, oferece uma análise clara sobre os factores que moldam este processo.

Os Dois Caminhos Pós-Golpe

A investigação de Elischer, que analisou 12 transições pós-golpe em países como Egito, Mauritânia, Níger, Fiji e Tailândia, identifica dois desfechos principais:

  1. Retirada da Junta: Os militares não interferem nas eleições subsequentes. Este cenário, observado em cerca de metade dos casos estudados, é uma condição necessária, mas não suficiente, para uma transição democrática (ex.: Níger, 2010).
  2. Manipulação e Entrincheiramento: A junta manipula o processo eleitoral para se perpetuar no poder, estabelecendo um regime autoritário de médio a longo prazo.

Os Factores Decisivos: Coesão Militar e Sociedade Civil

Elischer examinou quatro variáveis, concluindo que duas são fundamentais:

  1. A Coerência Interna das Forças Armadas (Factor Principal):

Se o golpe foi motivado por ameaças à integridade territorial, à ordem pública ou aos privilégios materiais/reputacionais dos militares, a junta terá amplo apoio interno. Nestes casos, os benefícios de permanecer no poder superam os riscos, tornando a retirada improvável. É o cenário atual no Sudão, Mali e Burkina Faso.

Se o golpe surgiu de motivações mais restritas (ex.: uma facção defendendo seus interesses), pode enfrentar resistência interna, aumentando a probabilidade de uma retirada volátil. Esta parece ser a dinâmica no Níger e na Guiné.

  1. A Capacidade de Mobilização da Sociedade Civil (Factor Secundário, mas Crucial):

Protestos massivos e organizados podem forçar a junta a ceder o poder. O exemplo mais marcante foi no Egito após 2011.

Nota Importante: A investigação de Elischer indica que a pressão internacional (sanções, cortes de ajuda) ou a pertença a organizações regionais tem pouca influência discernível nas decisões da junta. As variáveis domésticas são predominantes.

Implicações para a Actualidade Africana: Um Panorama Preocupante

As conclusões da investigação são alarmantes para os cenários atuais:

  • Países em Risco de Permanência Militar: No Sudão, Mali, Burkina Faso e Chade, os golpes alegaram ameaças à soberania ou estabilidade. Isso garante à junta um forte apoio castrense, diminuindo drasticamente as perspetivas de um regresso rápido ao poder civil.
  • Países com Futuro Mais Volátil: No Níger e na Guiné, onde os golpes parecem ter origem em motivações mais faccionais, a coesão militar é mais frágil. O futuro dependerá da capacidade do líder golpista (como o General Abdourahmane Tchiani, no Níger) de unificar as forças armadas em torno do seu governo.

Conclusão: Um Saldo Negativo para a Democracia

De um modo geral, os golpes militares têm consequências devastadoras para os direitos políticos e civis. Como sublinha Elischer: “Quando as juntas se retiram, democracias plenas raramente emergem. Quando manipulam eleições, entrincheiram-se no poder. Em qualquer cenário, são a população e as instituições democráticas que saem a perder.”

Por: CMDT: Osvaldo Viera

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